Argumento

Nesta pesquisa pretende-se estudar como se deu a retomada do cineclubismo na cidade do Rio de Janeiro. Quem o pratica e com quais intenções, o que motiva esta pratica social e como e se ela se reflete em outras esferas de relações.

A escolha do recorte na cidade do Rio de Janeiro se justifica pela importância histórica que a cidade tem para o movimento. Foi nela que surgiu o primeiro cineclube do país, o Chaplin Club, fundado em junho de 1928. Os cineclubistas do Estado do Rio de Janeiro compuseram a primeira Federação a se reorganizar após o golpe de 1968. Hoje o Rio é o estado mais expressivo em número de cineclubes depois de São Paulo.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Vinheta - Cachaça Cinema Clube

Esta vinheta mostra o quanto os cariocas estão enebriados de cinema.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Entrevista com Nelson Pereira dos Santos - Cine ABL


Nelson Pereira dos Santos (Cine ABL)

O que chamamos aqui de Cine ABL é a Mostra de Cinema e Literatura promovida pela Academia Brasileira de Letras sob idealização e organização de Nelson Pereira dos Santos, “imortal”, ocupa a cadeira sete da Academia, cineasta, doutor e fundador da primeira faculdade de cinema do Brasil. O cine ABL está em seu segundo ano e é mantido pela academia como atividade aberta ao público semanalmente com exibição de filmes com roteiro de adaptação literária, geralmente seguidos de debate com os diretores dos filmes.

Bruna Brasil: O senhor considera essa mostra da ABL um cineclube?


Nelson Pereira dos Santos: É, é um cineclube. Temático, digamos.

BB: Mas foi uma opção não usar o nome “cineclube” ou não ocorreu no momento?

NP dos Santos: A idéia era de se fazer um trabalho de exibição permanente. Ela nasceu como a mostra dos filmes brasileiros baseados na obra de Machado de Assis. Porque ano passado foi o ano do Machado de Assis. Então, por contribuição às comemorações do centenário (da morte) do Machado, a gente bolou essa mostra. Então foram exibidos filmes baseados na obra de Machado de Assis no primeiro semestre. Mas (a mostra) ganhou um público. Então vamos continuar com cinema e literatura brasileira. Então no segundo semestre tivemos filmes brasileiros baseados em obras literárias brasileiras. Está continuando nesse semestre (desse ano, 2009). E agora no segundo semestre nós vamos partir para a exibição de filmes baseados em obras literárias internacionais. Então teremos cinema francês, inglês, russo... Saber quais filmes a gente sabe, agora, a dificuldade é encontrar as cópias. E mais ainda a permissão para exibição. Agora, com relação ao filme brasileiro não tem problema nenhum, são todos amigos, conhecidos... E daí, então, virou um cineclube. Quer dizer, qual é a característica do cineclube? É ter freqüência marcada nos filmes, e que também aconteça um debate. O filme proporciona muito isso. Nos filmes de Machado de Assis, por exemplo, a platéia discutia idéias que o filme tinha suscitado. Por isso que eu digo que aqui é um cineclube temático, porque se o público falava de Machado de Assis, ninguém tava falando de cinema, mas falando de preconceito racial no Brasil. Qual a nossa situação, como nós herdamos isso... O cineclube tem esse poder. Outro dia, que o Walter Lima esteve aqui e o debate foi até meia noite. E ele é bom, ele sabe fazer isso, é um cineclubista veterano.

BB: O senhor também, não?

NP dos Santos: (risos) Sim. Me perguntaram: “O que você faz na Academia?” ou ainda “O que você faz aos 80 anos?” Respondi: “Eu faço a mesma coisa que quando tinha 16. Cineclube”. (risos)

BB: E qual a diferença desse cineclube, de quando você tinha 16 anos, pra esse de agora?

NP dos Santos: O mecanismo entre filmes e debates e tal é um pouco parecido, o que muda é, evidentemente, a época, as questões mais importantes de hoje. Algumas continuam as mesmas, infelizmente, mas... é muito parecido. E outra coisa importante... Isso é que é importante: naquele tempo, o cineclube era feito pra gente ver as grandes obras do cinema internacional. A gente queria ver o Encouraçado Potemkin, Eisenstein, Atlantis... Era toda uma posição colonizada mesmo. E discutia-se a fotografia, a forma dos filmes, e o que os filmes suscitam mais: questões básicas do cotidiano, suas relações humanas, sociais. O nosso cotidiano é refletido na tela. E a tela nos provoca a discutir o cotidiano. Acho que esse é o grande barato do cineclube. Porque o cinema levanta discussões diversas. Veja esses meninos, não é? (referindo-se à exibição de um filme infantil naquele dia, onde várias crianças interagiram). Outra coisa: (o fato de) permitir falar com as outras pessoas. Muito embora (alguns meninos) tenham falado de costas (risos)... E (tratar de) questões pertinentes. Nenhum deles se comportava como espectadores mesmo.

BB: Você está a par dos outros cineclubes que estão acontecendo na cidade? Conhece ou já freqüentou alguns desses cineclubes de agora?

NP dos Santos: Tem o cineclube da ABD (Associação Brasileira de Documentaristas); faz tempo que eu não vou, mas é todo sábado. Tem o Cineclube Cachaça, que dizem que é divertido... É de outro tipo, né? Mas não tenho tempo, é muita coisa...

BB: É que eu queria perguntar, caso o senhor tivesse acesso, acompanhado alguns desses cineclubes, justamente a sua opinião sobre que cineclubismo é esse que se faz hoje. Que tem várias modalidades, vários tipos... Existe até um conceito de cineclube. Mas, ás vezes, na prática, a gente vê que eles têm muitas coisas diferentes.

NP dos Santos: Não posso julgar, porque conheço pouco... Mas eu acho que é altamente positivo, por todas as razões. E o que é interessante, exatamente, é a diferença, a pluralidade de estilos. Isso é importante. É fundamental que o freqüentador tenha liberdade de julgar, de conhecer, de discutir... Cineclube fechado, tem quem goste. Cineclube stalinista... Já aconteceu isso. Você ia lá e só podia pensar daquele jeito. A tendência de regulamentar é meio chata. Sérgio Buarque de Holanda tinha essa coisa de pensamento liberto, mas criava normas. Ao mesmo tempo, ele era completamente caótico; grandes contradições...

BB: Então o senhor não concorda com essa regulamentação?

NP dos Santos: Nós adoramos uma inquisição (risos). Vamos ver, com o tempo, se acontecer uma rebelião, vamos mostrar os problemas lá no meio da rebelião, não importa o porquê nem contra quem. Pelo que eu conheço daqueles cineclubes, eu acho que eles têm que ser bem abertos, de acordo com a sua clientela. Quem faz o cineclube é o freqüentador. Ele é bastante livre pra criar, acho que isso não tem que ter uma norma. Afinal de contas, o cinema não é religião. Nem partido político ou escola filosófica. Pelo contrário, o cinema odeia toda e qualquer possibilidade de redução.

BB: Apesar de ter sido apropriado por essas instituições.

NP dos Santos: Temporariamente e em espaços políticos indefinidos. Isso é curioso: aconteceu que eu não pensei em fazer um cineclube. Teríamos apenas a mostra Machado de Assis. Aqui na Academia existe uma clientela bem tradicional, que é de gente madura, pessoas já resolvidas, aposentadas, e com um nível cultural elevado. Especialmente na área das letras. Pessoas que conhecem a história da literatura e que gostam, que vêm aqui... Ao mesmo tempo, a Academia promove visitas guiadas de escolas públicas. Vêm muita gente aqui que é população carente. Normalmente jovens estudantes. Teve antes uma exposição sobre o Machado de Assis enorme, lá num andar de baixo, e contrataram jovens pra trabalharem como guias... Garotos, alguns estudando pra fazer vestibular. Eles aprenderam (sobre Machado de Assis) e guiavam a garotada das escolas, escolas de todos os lugares... Aqui ficava cheio de gente, todo dia tinha alguma coisa. Aí uma parte desse público começou a freqüentar o cineclube. Então, de um lado, pessoas de uma certa idade, com a vida feita, resolvida, com um nível cultural-literário elevado, e do outro lado, uma juventude doida pra aprender, com aquela sede de leitura. Eu passei por isso; quando descobri que tinham bibliotecas públicas, ficava lá na fila pra pegar um livro e tal, ouvir música...

BB: Aí o cineclube promove o encontro entre essas pessoas...

NP dos Santos: É, a Academia adotou essa política há alguns anos, onde ela está deixando de ser aquela fortaleza anti-social. Faz de tudo o que ela faz, de graça. Aqui não é dinheiro público, a própria Academia tem as suas rendas.

BB: Durante 12 anos, praticamente não se tinha atividade cineclubista. Ela começou a retornar com os cursos privados de cinema, que antes já tinha na UFF, mas ainda sem a ebulição dos cineclubes. O senhor fundou a escola de cinema da UnB, em Brasília. Antes da escola de cinema, a formação básica dos cineastas se dava no ambiente do cineclube. O senhor identifica alguma mudança significativa nessa formação, quando ela sai do cineclube e vai pra sala de aula.

NP dos Santos: Ela muda pra melhor. A formação no cineclube era autodidatismo. Havia alguns cineclubes que tinha alguém com mais conhecimento, mas sempre na análise dos filmes. Na área técnica, profissional, não, era mais de análise. Discutia-se os filmes. Mas, de qualquer forma, no cineclube aconteciam duas coisas importantes. Uma era ver os filmes que eram representativos; filmes que têm um poder muito grande, emblemáticos, criadores de escolas. Outra coisa é que o cineclube provoca o encontro entre pessoas de um mesmo grupo, com a mesma idade e o mesmo interesse. E uma das coisas importantes das escolas de cinema é exatamente isso. Fazer um encontro entre pessoas que tenham o mesmo propósito, o mesmo objetivo de criação. E a troca é importante. Além disso, nas escolas eles têm uma vantagem que não se tinha naquele tempo, quando tinha que se ir no cineclube mesmo, pra ver 16 mm todo arrebentado. Pode-se ter então um VHS, ver um livro. Pode-se ver um clássico, ler uma bíblia, ela está à disposição. O Encouraçado Potemkin é um mito... O Limite não tinha cópias, não existia.O que existia era fotografia ou um ou outro livro ou guia de cinema. Até o Glauber (Rocha) uma vez escreveu um artigo falando pra se acabar com esse mito do “Limite”.

BB: O “Limite” tá no YouTube.

NP dos Santos: Hein?

BB: O “Limite”, tá no YouTube agora.

NP dos Santos: (risos) Tá no YouTube, agora? Era o mito do “Limite” porque tinha uma cópia e um grande amigo do Mário Peixoto guardou e não mostrava pra ninguém. Ele falou que não era qualquer um que ia compreender o filme, uma coisa parecida.

BB: Teve um cineclube que fez uma cópia... Acho que o filme era em 35 mm, não era? E aí um cineclube fez uma cópia em 16 mm e foi o que sobrou, porque o original queimou.

NP dos Santos: Eu não me lembro exatamente, o Saulo fez a restauração e guardou. E aí parecia um mito porque (era dito ao) pessoal que fazia cinema brasileiro, com seus 20 anos, “duvido que você vá fazer um filme melhor que o “Limite”. Ele já era castrado de início. O Encouraçado Potemkin: “Quero ver você fazer um Encouraçado Potemkin”. Mas pra se fazer um Encouraçado Potemkin, você tem que primeiro tomar o poder, fazer uma revolução e ter a marinha inteirinha, o exército inteirinho à disposição pra fazer o filme. Era uma mão de obra, hein? Então não adianta, eu vou filmar batizado...

BB: O senhor chegou a fazer esses filmes de batizado, casamento?

NP dos Santos: Não (risos). Mas, voltando à história das escolas, hoje você tem outra coisa: livros. Na minha formação, no final dos anos 40 e nos anos 50, não existia um livro de cinema em português brasileiro. O que a gente tinha era um livro russo que foi traduzido para o espanhol, então a gente lia em espanhol. “Tratado de La Realización Cinematografica”. Revistas de cinema... Tinha uma revista, tinha duas até, mas do tipo de divulgação de filmes, com os filmes que vão ser lançados, fotografias das atrizes. Era uma coisa da indústria de cinema, com críticas mais aprofundadas, só do cinema francês. E uma revista italiana... Aí a que a gente mais gostava se chamava “Cinema”. Eram as nossas possibilidades. Os filmes importantes, só em cineclube ou viajando pelas cinematecas de Nova York, Milão, ou em Paris, o que era muito difícil de conhecer. Hoje nós podemos ter todos os filmes que você pode encontrar, rever os filmes clássicos, filmes importantes da indústria de Hollywood, cinema japonês... Um neguinho aqui (na ABL), esses dias, tava no YouTube... cheio de serviços importantes. O que rola por aí é o DVD. Tem aí o Joaquim Pedro... Tá tudo aí. Os meus vão sair agora. Os livros de cinema, temos em bom número. De autores brasileiros e autores traduzidos. Antes a gente lia um grande roteirista americano, que era o Donald Walson, em inglês; o (...) depois traduziu esse livro, nos anos 70. Sobre roteiro hoje tem muito mais coisa.

BB: Nesse momento que estamos vivendo, quando qualquer filme é de fácil acesso, qualquer pessoa pode assistir no seu computador ou na televisão, no vídeo, já não há mais aquela necessidade de se ter o cineclube pra se ver determinados filmes que só poderiam ser vistos lá. Como o senhor explicaria essa proliferação (atual) de cineclubes?

NP dos Santos: Eu acho que há duas coisas aí. Está cada vez mais difícil para a sala de cinema. Pelo fato desse comportamento de se ver (filmes) em casa, com os amigos e tal. O bom daquele tempo, no cinema, era aquela matinê que todo mundo ia. Até no próprio bairro, nas cidades de interior. Aqueles filmes de domingo, de quarta-feira à noite, eram sempre assistidos em coletividade. Depois que acabava o filme, os homens iam ao banheiro, faziam pipi e discutiam o filme: “Que merda, hein?” (risos) Ou se o filme era bom... E as moças também... Depois se encontravam pra tomar um café ou uma cerveja e continuavam o papo. O cineclube provoca esse encontro, essa comunhão em torno do filme e, em seguida, a conversa, o debate. Era um acontecimento social muito bom e agradável.

BB: O senhor tem conhecimento das atividades do Conselho Nacional de Cineclubes, ou da ASCINE? E o senhor tem interesse na integração entre o cineclube da ABL e esses movimentos? Como o senhor se situa na esfera mais política desse movimento?

NP dos Santos: Não estou muito... Recebo, de vez em quando, por e-mail, algumas informações. Mas por enquanto não tenho nenhum contato direto. Claro que seria interessante participar. São duas...

BB: O Conselho Nacional de Cineclubes é a entidade nacional e a ASCINE é a Associação de Cineclubes do Rio de Janeiro. Existe a ASCINE nacional e as regionais.

NP dos Santos: O que acontece aqui é que temos um cineclube, mas não é uma organização independente. Essa é uma atividade da Academia. Um cineclube tem a diretoria, os responsáveis, etc. e tal. Mas aqui não é isso. Esse cineclube é uma mostra de filmes...

BB: Nesse contexto da contemporaneidade, nem todos os cineclubes são constituídos como entidades independentes. Na verdade, essas entidades políticas, até onde eu entendo, pretendem reunir todas as atividades afins, pra que haja um diálogo, um fortalecimento de idéias, de corpo... Tanto que essas pessoas que estão fazendo essa atividade até têm um controle. Por exemplo, existe uma parceria com a Riofilme, que distribui ingressos pros cineclubes. Pra se ter uma contagem de público cineclubista. Quantas pessoas estão indo a sessões com debates gratuitos? Então, não necessariamente a questão do estatuto, da diretoria...

NP dos Santos: A Juliana (sua secretária) vai procurar saber...

BB: Eu fiz um levantamento de mais de 40 atividades cineclubistas na cidade, foras as que têm em toda a região metropolitana, enfim... Na Baixada Fluminense tem muita coisa... E eu observei que mais da metade não está afiliada. Isso que levantou essa pergunta: não estar afiliado é um posicionamento político? É um desconhecimento da atividade?

NP dos Santos: Desconhecimento... Aqui, no caso, é total. A gente não pensava em fazer um cineclube, pensava só em fazer uma mostra.

BB: E o cineclube aconteceu espontaneamente. E agora que ele existe, o que o senhor espera que o cineclube resulte?

NP dos Santos: O ideal seria que ele tivesse permanência. Uma atividade com essa freqüência, com garantia... E pra lidar com o público, precisa de um apoio. Onde achar os filmes? Onde achar os distribuidores?

BB: É um dos papeis dessas entidades.

NP dos Santos: Isso é interessante.

BB: A Programadora Brasil, por exemplo, surgiu dos cineclubes, ou melhor, do Conselho Nacional de Cineclubes.

NP dos Santos: Programadora Brasil é coisa chapa-branca.

BB: Mas é pra distribuir os filmes. É uma espécie de DinaFilme.

NP dos Santos: Tudo que é chapa-branca não dá em nada.

BB: Como que é isso de chapa-branca (risos)?

NP dos Santos: É do Ministério da Cultura, da Cinemateca Brasileira... Eu li sobre aquilo, os produtores não se interessam por aquilo. Não têm o menor interesse. Porque não têm nenhum retorno, nada.

BB: É porque o objetivo é distribuir pros cineclubes que fazem as exibições gratuitas. Se o cineclube não cobra ingresso, não tem como ter verba pra pagar os filmes.

NP dos Santos: Mas então o Ministério paga e dá de graça pros cineclubes. O problema é esse. Eles querem fazer política, ficar bem às custas dos produtores. Por exemplo, aqui nós negociamos diretamente com os produtores e todos colaboram. Mas se você fizer através de um... é muita repartição pública... Se você avaliar, eles deviam dar direto pros cineclubes.

BB: Eu tive acesso a poucos documentos que falassem sobre a Dinafilme. Porque a Embrafilme surge antes da Dinafilme, não é? A Embrafilme é de 1969 e a Dinafilme é de 1976.

NP dos Santos: O que é?

BB: A Dinafilme? A Dinafilme foi uma distribuidora, Distribuidora Nacional de Filmes, que foi criada pelo Conselho Nacional de Cineclubes. Porque a Embrafilme era pra distribuir a produção nacional no exterior.

NP dos Santos: Não, é a do começo, a primeira. Depois ela foi mudada, em 1974. A Embrafilme passou a ser uma coisa: uma produtora, distribuidora, exibidora, importadora... Foi uma grande mudança. A obrigatoriedade de exibição era de 180 dias por ano, todas as salas de cinema tinham que passar filmes brasileiros no mínimo por 180 dias... Foi uma mudança radical. A parte da produção... A Embrafilme podia entrar na parte da produção com 40% do custo do filme, mas ela não podia ser a produtora. A produção tinha que ser independente e ela apoiava com 40%. Pras distribuidoras a Embrafilme adiantava outros 40%. Foi aí que o cinema brasileiro se fez assim.

BB: Até a hora que o Collor a extinguiu... Mas aí sobre a Dinafilme o senhor não sabe?

NP dos Santos: Não, isso naquela época...

BB: Em 1976 ela foi inaugurada, mas ainda não achei um documento que me dissesse quando ela acaba. Naquela época, com a ditadura, era muito complicado pros filmes chegarem aos cineclubes. Então, o Conselho Nacional de Cineclubes, em 1976, fundou a Dinafilme, pra ter uma distribuidora pros cineclubes. Só que tinha muita invasão da censura e tal. E confiscavam os filmes, queimavam tudo. Isso inviabilizou. E também eles tinham um problema de logística, pra distribuir os filmes era complicado. Mas a iniciativa era pra ser essa. Mas não sei quanto tempo durou, quando acabou, por que acabou.

NP dos Santos: Eu não lembro disso. Na Embrafilme foi criado um departamento que atendia os... Como chamava mesmo? Qualquer-coisa Cultural... Que atendia os cineclubes, fazia distribuição de 16 mm, publicava revistas de cinema... Aí virou o CTAv. Esse departamento foi transformado no CTAv. Um embrião do CTAv. Mas me esqueci o nome...

BB: O CTAv não tem muito diálogo com os cineclubes hoje. Tem?

NP dos Santos: Acho que não...

BB: Virou chapa-branca (risos)?

NP dos Santos: Virou chapa-branca...

(conversa informal)

BB: Agora uma curiosidade, que não tem nada a ver com a minha entrevista (risos), o senhor vai mesmo fazer o filme sobre o Castro Alves?

NP dos Santos: Tá muito difícil. A captação é muito difícil, o mais difícil. É muito caro o filme. Eu tentei fazer, não consegui. O que eu consegui foi assumir um outro projeto, do Casa Grande e Senzala. Pra terminar eu estou com (o documentário sobre) o Tom Jobim, desde 2006. Agora eu consegui com a RioFilme, pra terminar... Já estou na fase final, no corte final. E vai ficar pronto no próximo semestre. Mas não consegui captar o que precisava. É uma mixaria pro documentário do Tom Jobim.

BB: O velho problema do cinema brasileiro.

NP dos Santos: (risos) Agora... tem outros projetos aí, mas por enquanto nada de mais. Enquanto não entregar esse do Tom Jobim não posso pensar em mais nada.

domingo, 17 de maio de 2009

CINECLUBE CARIOCAS-PARTE 2

CINECLUBE CARIOCAS-PARTE 1

Importante documentário realizado por alunos da Estácio que retrata um ponto de vista sobre o universo cineclubista carioca.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Participação dos cineclubistas fluminenses na Pré-Jornada Nacional de Cineclubes

A participação dos cineclubistas do Estado do Rio de Janeiro no evento, que durou quatro dias, foi intensa e engajada. Houve uma tensão natural, devido ao peso da delegação fluminense ser responsável pela produção da 27ª Jornada Nacional de Cineclubes, a ocorrer no Rio no ano comemorativo de 80 anos da atividade, 2008.

Os temas decididos como base para a Jornada Nacional de 2008, foram: o projeto da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (ANCINAV), o cineclubismo na educação, a sustentabilidade da atividade, a comunicação do movimento na rede audiovisual e os direitos do público. Este último tema talvez seja o termo que mais traduza esse movimento; quais são os direitos do espectador, como garanti-los e quais os seus limites?

No capitalismo, as obras de arte são mercadorias. Isso se aplica à informação jornalística e a tudo que está na mídia. A abordagem de Néstor García Canclini sobre esse tema é de que o problema da projeção do real nas produções latino americanas deriva da propriedade privada dos meios de produção, que tem por função servir a uma economia mercantilista. O mercado cultural, que permite ao artista viver da sua produção, submete a obra à homogeneidade cega dos preços e determinações dos compradores.

A atividade cineclubista se torna, assim, uma válvula de escape desta mercantilização da produção artística. Unida à democratização dos meios de produção deflagrada pelas novas tecnologias, mais leves, mais baratas e de manuseio mais simples que as máquinas de cinema anteriores, os cineclubes ressurgem como um espaço para escoar essa produção independente e democrática, livre de motivações econômicas, normalmente excluída das salas de cinema comerciais e até mesmo dos festivais, já que muitos exigem que uma produtora (pessoa jurídica) inscreva o filme.

Mesmo em cineclubes como o da ABI e o Cinegostoso, onde se exibem filmes antigos, observa-se o engajamento frente à esta causa. Tais filmes também não se encontram disponíveis nas salas comerciais e alguns nem mesmo nas melhores locadoras.

Nesta pequena inserção no universo cineclubista, percebe-se não só uma modesta democratização dos meios de produção e exibição cinematográficos, mas também uma apropriação da atividade artística e cultural como meio para revitalização. Nesse ponto, chega-se até à reutilizações de espaços físicos e sociais, como prédios de prostituição e auditórios institucionais, antes usados apenas por uma classe ou atividade específica. Com o cineclube, esses lugares passaram a ser abertos ao público.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Viagem cineclubista

Sexta-feira, 11 de outubro, às 6 horas da manhã, eu e meu marido embarcamos, a convite do presidente do CNC, num ônibus que veio de São Paulo para buscar os cineclubistas cariocas para a Pré Jornada Nacional, que ocorreria em Vitória (ES).

Eram 26 pessoas representando o Rio de Janeiro, entre os quais Gabriela Paes de Carvalho Rocha, representando a ANCINE, Alessandra Stropp Borba, pela União Nacional dos Estudantes (UNE), e representantes da ASCINE – RJ (Associação de Cineclubes do Rio de Janeiro) e da ABD & C (Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-metragistas do Rio de Janeiro).

Foi uma viagem agradável, de uma harmoniosa integração entre paulistas e cariocas contrariando as lendas de rixas que envolvem os dois estados. Nas 12 horas de viagem foram exibidos diversos estilos cinematográficos, desde expressionismo alemão até filmes de humor do site Youtube (www.youtube.com).

A proposta não era assistir e debater, como na premissa cineclubista, mas os comentários e trocas de opiniões foram surgindo expontâneamente durante a exibição dos filmes.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Cineclube universitário faz exibição sem debate

Na terça-feira, dia 02 de outubro, não havia nenhuma sessão. A maioria delas é mensal ou quinzenal, e quase todas acontecem no final da tarde ou à noite.

Na quarta-feira, fui ao Cinerama, o Cineclube da ECO, a Escola de Comunicação da UFRJ. Era uma iniciativa dos alunos. As atividades então,aconteciam quinzenalmente no auditório da CPM, no campus da Praia Vermelha, às 18 horas.

Quando cheguei ao CPM (Centro de Produção Multimídia), não havia nenhum indício da exibição. Já estava na hora marcada e ninguém da organização estava presente. Nenhum público à espera, nada. Resolvi perguntar ao segurança que tomava conta da portaria, ele estava atrás de um balcão, com o que parecia ser um livro de ponto aberto à sua frente.

O segurança me informou que não haveria sessão, que não tinha ninguém do cineclube e nenhum cartaz que indicasse o evento. Já estava indo embora quando os responsáveis pelo Cinerama chegaram, afobados. Uma menina falava ao celular, perguntando sobre a cópia do filme que seria exibido. Perguntei aos outros se eles eram do Cinerama e recebi a confirmação. Perguntei ainda se haveria sessão e eles responderam que sim, entre risos de constrangimento pela confusão. Avisei que o segurança estava informando que não haveria exibição e eles foram falar com ele. “Ih, já mandei um monte de gente embora, vocês não colocam cartaz aqui. Como é que eu vou descobrir que vai ter filme?”, disse o funcionário.

Finalmente, chega o rapaz que estava encarregado de trazer o filme. Ele se atrasou porque não conseguia estacionar o carro. A exibição do filme Ritual dos Sádicos, de José Mojica Marins (o Zé do Caixão), começa com mais de meia hora de atraso.

O Cinerama costuma realizar sessões sob eixos temáticos. Desta vez, se tratava da questão sado-masoquista. Nem sempre são feitos debates e, na ocasião, nada havia sido planejado para que houvesse um. Apenas oito pessoas na platéia composta pelos organizadores, eu e uma amiga, que convidei para a exibição. Ao final do filme, só restamos nós duas, mais duas pessoas da organização.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Segunda feira, primeiro de outubro, dia da seção semanal do Cine ABI.

A Associação Brasileira de Imprensa fica na Rua Araújo Porto Alegre, 71, num majestoso e fúnebre prédio institucional da década de 1950. Segundo o arquiteto Lauro Cavalcanti o edifício foi o primeiro arranha-céu modernista do mundo. A sede, palco de campanhas históricas e alvo de atentados, está com nove dos 13 andares penhorados. Os gigantescos halls vazios e escuros revelam que ABI é hoje uma sombra do passado de lutas pela democracia e pela liberdade de imprensa.

Ao sair do elevador me deparei com um grupo de pessoas, todas com mais de 50 anos, conversando no hall do auditório. Fui assinar o livro de presença e pude observar que ali tinha um público de mais ou menos 35 pessoas, entre os que assinaram e os que esperavam para assinar.

Entramos todos, a programação se trata de O signo do Caos de Rogério Sganzerla, um filme experimental de quase duas horas, com um áudio que pouco se entendia e uma estética pouco compreendida até no meio intelectual cinematográfico.

Estavam presentes dois atores do filme: Helena Inez, que é também viúva do diretor e Eduardo Cabus. A sessão é aberta por um longo discurso do também cineasta e professor de cinema da UFF (Universidade Federal Fluminense) Sérgio Santeiro, seguido da fala da viúva e atriz do filme. Todo discurso não passa de uma ode ao cinema experimental e uma homenagem ao falecido diretor.

Tem início o filme, pouco mais de meia hora depois as pessoas começam a sair da sala. Era um projeto experimental demais para aquele público, composto, majoritariamente, por senhoras idosas pertencentes a uma elite conservadora.

Ao fim da projeção preciso ir ao banheiro, quando volto encontro com Jesus Chediak, diretor cultural da ABI, no hall dos elevadores, ele estava preocupado com a debandada do público e puxou conversa comigo dizendo – “Não vamos mais passar este tipo de filme aqui, vou falar com o Santeiro, o público daqui não está preparado." – Só ouvi e procurei ser simpática, entramos juntos para o debate.

Ainda restavam umas 15 pessoas, logo descobri que 10 eram do núcleo da casa. Eles fizeram um semicírculo entre as primeiras cadeiras perto do palco com as duas pessoas que estavam no palco, mais uma vez Helenas Inez e Santeiro. Começou uma discussão sobre a personalidade do diretor, sua ousadia, como era a experiência de trabalhar com ele, a conversa era tão íntima e especializada que as demais pessoas se sentiram deslocadas e logo se retiraram, eu inclusive.

terça-feira, 10 de março de 2009

Vencendo medos e preconceitos num cineclube diferente

No domingo, 30 de setembro de 2007, a experiência foi bem diferente. O horário escolhido para a atividade cineclubista foi o mesmo do da ABD&C, no final da tarde, mas a proposta era outra. Cinegostoso ou “Como é gostoso nosso cineclube” é uma das atividades dentro do projeto SEX_ART, que “está transformando hotéis de alta rotatividade, em galerias de arte erótica”.

Artistas de diversas áreas e correntes pintam a arte do sexo nos quartos e dependências dos hotéis, estes, se disponíveis podem ser visitados por quaisquer transeuntes amantes das artes, 24 horas por dia, sete dias na semana.

O Cinegostoso entra nessa programação utilizando uma espécie de sala de “conferência” do hotel que se está trabalhando no momento, no caso o Hotel Paris, na Praça Tiradentes (centro da cidade), todo último domingo do mês.

Os filmes exibidos são clássicos pornográficos e da Pornochanchada brasileira e após cada exibição é realizado um debate com a presença de algum convidado que tenha participado do filme.

Confesso que fomos à Praça Tiradentes, eu e meu marido, porque sem conhecimento prévio do ambiente, não teria coragem de ir desacompanhada. Foi com um misto de euforia curiosa e preconceito em relação aos tipos que poderíamos encontrar por lá, afinal, tudo se espera quando se aventura a visitar um hotel de prostituição do centro da cidade, que nos lançamos nessa experiência.

O Hotel Paris é fácil de localizar, fica bem em frente ao teatro João Caetano. A boa movimentação cultural do teatro produz uma certa tranquilidade. “Ao menos o entorno parece bom”, comentou meu marido. A entrada do hotel era uma pequena e velha porta com uma escada de degraus bem gastos, no estilo dos velhos sobrados do início do século passado.

Ao subir as escadas, no primeiro lance um casal que parecia trabalhar na recepção logo nos indicou o local da exibição sem mesmo que perguntássemos qualquer coisa. Uma prostituta negra, vestida de trajes simples, cruzou conosco pelas escadarias, em silêncio.

Senti que nossa aparência já denunciava o porquê da nossa presença ali. Seguimos por um corredor estreito de iluminação vermelha, até que chegamos a uma sala relativamente espaçosa com uma espécie de palquinho logo na entrada. O mastro no centro do pequeno palco revelava a original utilização do espaço, agora revertido em balcão para expor camisetas do movimento Sex_art entre outras roupas de brechó chique. As portas das sacadas estavam abertas o que oferecia boa ventilação ao lugar numa tarde quente e abafada. A vista para o teatro era agradável e trazia pra dentro do hotel uma lufada cultural. Ali naquela sala o clima não era mais de rendez-vous.

Um vídeo clipe de música clássica experimental introduzia os presentes, possivelmente equivocados, ao nível intelectual da proposta artística. Esta era a segunda sessão do cineclube, de um movimento que já existe há mais de um ano e já está transformando o segundo hotel de prostituição do centro da cidade em também um espaço cultural.

Surpreendeu por sua recente iniciativa a pequena sala contar com dezoito espectadores. Quase a mesma quantidade de público do tradicional cineclube visitado no dia anterior. Imaginava encontrar um público semelhante ao que frequenta os cinemas de pornografia do Centro da cidade. Formado na maioria, se não na totalidade, por homens, que buscam desafogar seus desejos sexuais incontroláveis no intervalo de almoço da sua jornada de trabalho.

O público na verdade era formado por jovens de ambos os sexos interessados em cinema. Muitos deles eram casais e alguns estudantes de cinema, talvez atraídos pelo organizador da sessão, e então diretor da ASCINE Rodrigo Bouillet, cria do curso de cinema da UFF.

O filme do dia era As estórias que nossas babás não contaram, filme que marcou a carreira da atriz e dançarina Adele Fátima, e que o organizador da exibição copiou diretamente da TV a cabo. Quando a atriz foi convidada para palestrar se animou em comparecer, mas logo que soube onde seria realizada a sessão declinou sua intenção em participar deixando um buraco no debate.

Foi uma pena, mas há que se entender a posição da atriz que em outros tempos foi muito apontada como colega das meretrizes que trabalham naquele lugar. Hoje, prefere não frequentar a fim de evitar más interpretações acerca da sua conduta.

Debate mesmo não houve, apenas uma fala de Rodrigo e de mais um estudante da UFF que está produzindo um documentário sobre Adele Fátima, de sua trajetória como atriz. Mesmo com o debate frustrado, a ausência da palestrante foi uma mensagem que o público recebeu e saiu dali refletindo e comentando com outros. Para esta sessão pagamos cinco reais por pessoa e ganhamos três rodadas de pipoca durante o filme.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Racismo é discutido no cineclube da ABD&C em parceria com a ONG Estimativa

Sábado, dia 29 de setembro de 2007, na sessão do cineclube ABD&C, que acontece regularmente todos os sábados na Casa de Cultura Rui Barbosa.

Esta foi uma exibição produzida em parceria com a ONG Cinemativa, que apresentou dois filmes com a temática de identidade afro-descendente e vida familiar. Dos filmes exibidos, Família Alcântara, um documentário que conta a história de uma família descendente de africanos escravizados em Minas Gerais, foi o que eu pude assistir por inteiro.

Entre uma sessão e outra os representantes da ONG fizeram uma interferência apresentando o filme seguinte e lembrando aos presentes que após a seção seria feito um debate.

Quando entrei no meio do filme anterior, não tive dificuldades em encontrar um lugar para me sentar mesmo em meio à escuridão. A sala da Casa de Rui Barbosa é grande e imponente e o público não parecia numeroso. Ao acenderem as luzes pude perceber que não chegava a vinte pessoas, algumas das quais não ficaram para assistir o filme seguinte.

Os documentários, muito bem produzidos e de temática interessante pareciam não ser suficientes para atrair grande público mesmo com entrada franca. Alguns fatores, como a escolha do dia de sábado à tarde numa cidade como o Rio de Janeiro, quando a praia passa a ser o maior atrativo da população, pode ser uma explicação. Outra poderia ser a fraca divulgação restrita a programação no site da Fundação.

Ainda durante o filme pude perceber, sentado algumas cadeiras à minha esquerda, um senhor negro a fazer anotações em um bloquinho, pensei logo que se tratava de algum acadêmico realizando uma pesquisa. Quando o filme acaba e as luzes se acendem, alguns dos poucos espectadores se retiram da sala, mesmo perante o posicionamento dos organizadores à frente da tela. Tem início o debate com a seguinte pergunta:

“Bom pessoal... o que vocês acharam dos filmes?”

O silêncio é aterrador. À frente da tela está um casal negro, a moça representa a ONG Cinemativa e o rapaz representa o Cineclube ABD&C. Diante do silencio a moça resolve apresentar a ONG: “Cinemativa é um projeto de cinema itinerante da ONG Estimativa que visa fazer parcerias com diversas instituições a fim de exibir filmes nacionais e documentários para que o povo brasileiro possa ver na tela o seu próprio rosto”. A ONG tende a trabalhar com questões de gênero e raça, possuindo também um projeto que comemora o Dia Internacional da Mulher Negra, daí a importância de se debater os temas trabalhados nos filmes como a questão da identidade negra nas famílias brasileiras.

Quando uma pessoa se anima a falar parece que outras também se encorajam. Apesar da temática étnica o público era bastante diversificado. Quando começou a se falar sobre as questões de discriminação racial, e dificuldade do próprio negro brasileiro em se assumir como negro, uma mulher, de mais ou menos 50 anos pediu a palavra e contou que sua origem árabe, despertou muito preconceito nos seus colegas na infância. Lembrou que a discriminação não é racial e sim cultural e que tudo que é diferente geralmente causa repulsa.

Outros relatos semelhantes foram proferidos em relação aos índios e pessoas de comunidades marginalizadas. Duas mulheres solicitaram a exibição do filme “Brasileirinho” que está há tempos sendo esperado entre a programação do cineclube. O cineclube da ABD&C (Associação de Documentaristas e Curta-metragistas) prioriza a exibição destes formatos, mas a seleção temática dos filmes é variada a cada semana.

Mesmo em dia de pouco público, afinal não fui a outras seções para ter um parâmetro de audiência, pude perceber a presença de pessoas cativas entre os demais atraídos pelo tema. Podemos dizer também que apenas um terço dos presentes no início da sessão do primeiro filme ficou para o debate final. Mas para os que ficaram, mesmo com as dificuldades de iniciar o bate papo, o conteúdo da discussão foi bem proveitoso em relação à proposta trabalhada nos filmes.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Um debate sobre a regulamentação da atividade promovido pela ASCINE – RJ e o Festival de Cinema do Rio 2007

Setembro de 2007, no teatro do Centro Cultural da Justiça Federal.

Compunham a mesa, o presidente do CNC, o capixaba Antônio Claudino de Jesus, um dos diretores da ABD, o pernambucano Guilherme Whitaker e o paulista Leopoldo Nunes, chefe de gabinete da Secretaria do Audiovisual, para mediar Rodrigo Bouillet, um dos diretores da ASCINE – RJ.

A primeira fala foi do presidente do CNC, que fez um breve relato do histórico do movimento, enaltecendo a grande conquista de finalmente, com quase oitenta anos de atividade, ter seu reconhecimento por parte do governo federal, o que além de proteger as atividades, abre possibilidades para editais de fomento a abertura de novos cineclubes no território brasileiro.

Segundo o presidente do conselho, cineclube é uma entidade sem fins lucrativos que objetiva a formação de um público em defesa da soberania nacional. Uma entidade democrática na qual o centro da atenção não está nas estrelas do cinema e sim no seu público. “O cineclube é a cidadania do audiovisual nacional!” afirmava convicto Antônio Claudino de Jesus finalizando seu caloroso discurso de abertura da mesa.

O discurso de Claudino remonta uma inquietação expressa por Nestor Garcia Canclini (1984) em A socialização da arte, obra contemporânea da crise do cinema brasileiro que faz uma crítica ao modelo hollywoodiano que se impõe desde a produção audiovisual, passando pela sua distribuição e exibição, monopolizando todo o processo cinematográfico em panorama mundial.

Canclini discorre sobre a Induústria Cultural que ditou a classe comercial, determinando que deva se atender às necessidades das massas. E aponta que movimentos como Cinema Novo (Brasil) e Nouvelle Vague (Argentina) – 1960 – foram esforços em vão contra a eficácia da máquina comercial. Falta apoio econômico do Estado e a concorrência entre canais independentes planejados para a distribuição e as empresas norte-americanas é desigual, esclarece o autor.

A crise do cinema brasileiro no final dos anos 80 reduziu a atividade a um número tão ínfimo de cineclubes que não havia uma representatividade que justificasse a articulação nacional. A atividade foi considerada extinta e só em 1995 surgiu o movimento de repolitização do cinema brasileiro, que rearticulou o movimento cineclubista até a 24ª Jornada Nacional de Cineclubes.

Leopoldo Nunes, em nome da ANCINE (Agencia Nacional de Cinema) afirmou o interesse do governo federal em incentivar essa rearticulação e legitimação do movimento, reconhecendo a importância do papel do cineclube na formação do olhar e do imaginário coletivo.

Espera-se que este movimento estatal em relação aos cineclubes venha a minimizar os problemas apontados por Canclini. Os cineclubistas acreditam que, agora com o reconhecimento institucional, possam começar e a encarar a Indústria Cultural de frente e até judicialmente pelo direito de exibição. A primeira das brigas será pelo direito atemporal de exibição de filmes feitos com recursos da Lei do Incentivo Fiscal. “Se o filme é feito com dinheiro do povo, ele pertence ao povo”, disse o presidente do CNC.

A diretora da Riofilme, Germana Lúcia de Araújo, estava presente na platéia do evento. Em parceria com a ASCINE –RJ será feito um levantamento do público dos cineclubes associados e os dados serão públicos.

O não reconhecimento da atividade cineclubista pelo ECAD foi uma das discussões mais calorosas da noite, agora com reconhecimento institucional o ECAD não poderá mais “multar os cineclubes a torto e a direito”, segundo Whitaker.

Foi muito importante fazer esta primeira incursão começando pelo encontro com o movimento político da atividade. Assim foi possível contextualizar esta pesquisa com o atual momento e agora ir a campo observar se o discurso político do movimento cineclubista se confirma na atividade diária dos cineclubes cariocas.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Cineclubando - trabalho de campo - primeira incursão

Para esta primeira incursão no campo foi feito um levantamento dos cineclubes da cidade e suas programações. Neste primeiro momento observa-se que há um diálogo fluente entre a ASCINE-RJ e o CNC (Conselho Nacional de Cineclubes, e que os cineclubes filiados a associação local estão também no mapeamento nacional.

Em setembro de 2007, quando foi dado início a este trabalho, o mapeamento contava com 14 cineclubes cariocas, muitos dos quais (em torno de oito ou dez) criados e mantidos pela própria associação ou com a ajuda dela. O mapeamento hoje está em 32 cineclubes, mas com consciência de que há muitos ainda por serem mapeados.

Para o trabalho de campo foram escolhidos não só os cineclubes associados, mas também os independentes.

Os cineclubes visitados foram ABD&C (ASCINE), Cinegostoso ou Como é gostoso nosso cineclube (ASCINE), Cine ABI e Cinerama (UFRJ - ECO).

Foi montado um cronograma de visitação aos cineclubes e atividades afins, objetivando preencher o espaço de sete dias corridos com diferentes atividades cineclubistas na cidade.

A incursão tem início no encontro de Reconhecimento Instituicional dos Cineclubes. Um debate sobre a regulamentação da atividade promovido pela ASCINE – RJ e o Festival de Cinema do Rio 2007.

terça-feira, 3 de março de 2009

Panorâmica

A atividade cineclubista é praticada no Brasil desde 1928, quando na cidade do Rio de Janeiro foi fundado o primeiro cineclube do país, o Chaplin Club.

Por manter uma atividade sistemática e organizada alcançou grande repercussão nos meios cultos da então Capital Federal. Reunia as figuras de maior prestígio no ambiente cultural carioca, influenciando as principais polêmicas da época.

O Chaplin Club lançou, entre outros filmes que marcam a história do cinema no Brasil, Limite, de Mário Peixoto, e O Encouraçado Potemkin, de Serguei Eisenstein. Em agosto de 28 o cineclube criava a revista O Fã, seu órgão oficial, que duraria apenas dois anos.

Fazendo oitenta anos em 2008, os cineclubistas brasileiros, atualmente, são organizados por cidadãos de diversas representações sociais. Os cineclubes não nascem mais apenas dos núcleos cultos das grandes cidades, e suas motivações não se restringem às de ordem política ou estética.

segunda-feira, 2 de março de 2009

O outro lado da moeda tecnológica

As evoluções tecnológicas não trazem apenas vantagens. O movimento ainda encontra muita dificuldade para uma real ocupação no meio cultural. O que por um lado facilitou o acesso aos filmes e a prática de exibição, acabou também limitando, através do mercado de digitalização e de distribuição de filmes, a prática e o público de um cineclube, assim como resultou em brigas judiciais dos cineclubes contra as empresas distribuidoras pelo direito de exibição.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Um pouco de história

A primeira organização de um cineclube data da década de 1920, quando, através de encontros entre a obra cinematográfica e o público, promovia-se a discussão e o aprofundamento das idéias e conceitos presentes nos filmes.

Com isso, os cineclubes se vinculavam a uma atividade revolucionária característica da época, sendo perseguidos pelo autoritarismo e, em sua maioria, ignorados pela sociedade e pelo poder econômico.

Essa perseguição culminou na extinção quase total da atividade no ano de 1968. Até então, estima-se que havia 300 cineclubes em atividade em todo país, e esse número teria caído para 12 no ano seguinte. Em 1972 reorganiza-se a Federação Cineclubista do Rio de Janeiro, sob direção de Marco Aurélio Marcondes. A Dinafilmes, primeira Distribuidora Nacional de Filmes, é criada em 1976, na 10ª Jornada Nacional de Cineclubes, no ano seguinte Marco Aurélio Marcondes cria a Embrafilme, Empresa Brasileira de Filmes,que seria extinta na década de 1990.

Desde 1968 o movimento perdera sua expressão nacional; trinta anos depois se apresenta com nova roupagem, patrocinado por bancos e iniciativas privadas. Só sobreviveram os cineclubes de caráter mais comercial. Com o fim da Embrafilme, o cineclubismo ficaria 14 anos desarticulado, a última Jornada Nacional aconteceu em 1989. O evento só seria realizado novamente em 2003, em Brasília, o que na ocasião foi chamado de Jornada de Reorganização do Movimento
Cineclubista.

Atualmente, cerca de oitenta anos após a abertura do primeiro cineclube, o movimento conquista o reconhecimento institucional da atividade através de um documento assinado pela ANCINE em setembro de 2007. A conquista política, somada ao desenvolvimento da tecnologia digital e a liberdade de manifestação cultural, abre grandes possibilidades para a promoção de eventos de caráter cineclubista, que contam com um acervo digitalizado em constante desenvolvimento.

Conte sua experiência cineclubista

Para compreendermos o atual universo cineclubista carioca precisamos saber quem são os personagens que figuram esta história.

Caso você seja um cinéfilo frequentador de um cineclube, alguém que tomou a iniciativa de fundar um ou um realizador que tem no cineclube o espaço de distribiuição de sua obra, relate-nos sua história.

Ela será publicada neste blog e fará parte da pesquisa monográfica.